domingo, 29 de dezembro de 2013

Carta 11

Recebida em dezembro de 1880, de K.H. para A.O.Hume

Postado por G. Melo


TEMAS:

AS LOJAS E A FRATERNIDADE UNIVERSAL – RESSURGIMENTO DE ANTIGA CIVILIZAÇÃO – RESSURGIMENTO PODE SER ACELERADO – PRÉ-REQUISITOS PARA ISSO – LOJA DE LONDRES E A PESTILÊNCIA DAS SOCIEDADES – CONCEITO DE MORALIDADE – OS FINS E OS MEIOS – VONTADE E IMAGINAÇÃO


Contextualização:

Esta carta é uma resposta à primeira (das três) cartas escritas por Hume ao Mahatma. Hume não esperou pela resposta da primeira e mandou outras duas cartas. Com isso o Mestre teve uma visão mais abrangente da personalidade de Hume e expõe, através de um elegante e claro pensamento filosófico, as diversas contradições de Hume, a maioria gerada por seu orgulho, pelo desdém aos hindus, pela crença de que pertencia a uma classe superior de homens, o que já pressupõe a consideração de que os hindus formassem uma classe inferior.  

Para responder a essas contradições, o Mestre dá diversas informações da mais alta importância, mas que precisamos praticamente costurar. Vamos deixar de lado o foco na questão das contradições propriamente ditas para focar as informações.


Sobre a Carta:

As Lojas, como precursoras da Fraternidade Universal

Em mais de um trecho o Mahatma dá esse conceito acerca das Lojas Teosóficas: precursoras da Fraternidade Universal. Distingue ao mesmo tempo Loja de Escola de Magia. Em uma passagem usa a expressão “precursora”, em outra, denomina “loja da Fraternidade Universal”.

Ora, precisamos levar em conta vários pontos abordados, para compreender em sua abrangência esse conceito aparentemente simples: loja da Fraternidade Universal.

O primeiro, não necessariamente o mais importante, diz respeito ao conceito de Fraternidade Universal, expresso na Carta 10:

: “....uma associação de “afinidades” de forças e polaridades fortemente magnéticas, embora diferentes, centradas em torno de uma ideia dominante. O que um não consegue fazer – muitos, juntos, podem alcançar.”

Seria a Loja o caminho para formar essa associação de “afinidades”? Qual a importância disso?

Aparentemente fora de contexto, o Mahatma comenta: “Nem nos sentimos, de modo algum, preocupados com o ressurgimento de nossas antigas artes e elevada civilização, porque elas certamente ressurgirão no momento certo, e de forma ainda mais elevada....” Na sequência: “Temos tendência a crer em ciclos que voltam sempre periodicamente e esperamos poder acelerar a ressurreição do que já passou e se foi. .....A “nova civilização” será apenas filha da antiga e nos basta deixar que a lei eterna siga seu curso para que nossos mortos saiam dos seus sepulcros; mas estamos certamente ansiosos por acelerar o desejado acontecimento.”

No mesmo parágrafo, duas vezes a menção a “acelerar” o ressurgimento de uma antiga civilização, que voltaria, em função do cumprimento de um ciclo, ainda mais grandiosa. Grandiosa em que sentido, poderíamos perguntar. No parágrafo seguinte há importantes pistas.

“Os guardiões da Luz Sagrada não atravessaram vitoriosamente tantos séculos para naufragarem batendo nas rochas do ceticismo moderno. Nossos pilotos são marinheiros demasiado hábeis para que tenhamos medo de tal desastre. Sempre acharemos voluntários para substituir  as sentinelas cansadas, e o mundo, mau como é no atual período de transição, ainda pode nos fornecer alguns homens de quando em quando.”

Poderíamos inferir que as lojas, ao serem entendidas como precursoras da Fraternidade Universal, natural para a associação de afinidades de forças e polaridades magnéticas, seriam as ferramentas para gerar homens de quando em quando para substituir as “sentinelas cansadas” dos guardiões da Luz Sagrada, base para o ressurgimento de uma civilização, que já existiu e que voltará? As lojas poderiam, se cumprido seu papel, ajudar a acelerar esse processo, ao produzirem esses voluntários?

É possível, mas está faltando alguns ingredientes nessa equação, como vemos em outro parágrafo o Mahatma falar da filantropia dos ingleses carecer de caráter universal, portanto (a filantropia) “nunca foi estabelecida sobre a base firme de um princípio moral universal”. Cita Kant que define como um grande pensador e que eles (os Mestres) analisaram os ensinamentos morais de Kant e concluíram que os ensinamentos sobre o dever que define os métodos de ação moral “não chegam a uma plena definição de um princípio incondicional e absoluto de moralidade, segundo nosso ponto de vista.” 

Na Carta 70C o Mahatma diz que "não conhece 'um círculo perfeitamente puro' - que ensina a mais alta moralidade. 

Essa filantropia dos ingleses, diz o Mestre, “não pode ser tomada como um padrão absoluto de atividade moral, isto é, algo que produza uma ação eficiente.”....”Essa espécie de filantropia é semelhante ao amor, mas algo acidental, excepcional, e como o amor tem suas preferências e afinidades egoístas, ela é necessariamente incapaz de aquecer toda a humanidade com seus raios benéficos. Esse, penso, é o segredo do fracasso espiritual e do egoísmo inconsciente desta época. E você (dirigindo-se a Hume).....sendo inconscientemente uma personificação deste espírito da época, é incapaz de compreender nossas ideias sobre a Sociedade como uma Fraternidade Universal...”

Em todo o texto Fraternidade Universal está em itálico e as iniciais maiúsculas.

Nos parágrafos anteriores, o Mestre acrescenta alguns ingredientes a essa equação, que vamos simplificar, não para retirar a beleza e profundidade do pensamento do Mahatma, mas apenas para não perdermos o fio da meada:

- o dever

-  o amor altruísta ao contrário de uma filantropia sem base moral

-  moralidade, como princípio universal e incondicional

- superação da época em que vivemos, de ceticismo 


Vamos tentar fechar a ideia, resumidamente:

1.    Há uma civilização espiritual, que já foi antiga, já passou, mas voltará.

2.   Esse retorno pode ser acelerado ou deixado a cargo da lei.  

3.   Essa forma de acelerar, que é interesse dos Mestres, passa pelo estabelecimento de uma Fraternidade Universal.  

4.   O conceito de Fraternidade Universal foi dado na Carta anterior: : “....uma associação de “afinidades” de forças e polaridades fortemente magnéticas, embora diferentes, centradas em torno de uma ideia dominante. O que um não consegue fazer – muitos, juntos, podem alcançar.” 

5.   A Loja Teosófica é a precursora dessa Fraternidade Universal, portanto dessa associação de forças e polaridades magnéticas. 

6.   Mas, para haver essa associação, ou ainda, o estabelecimento de forças e polaridades magnéticas, são necessários vários pré-requisitos, cujo desenvolvimento pode ser objetivo da Loja:  

(I)         o senso do cumprimento do dever;
(II)        o amor altruísta ao contrário de uma filantropia sem base moral, o qual seja capaz de "aquecer" a humanidade como os raios do sol;

(III)       a  moralidade, como princípio universal e incondicional;

(IV)      a superação da época em que vivemos, de ceticismo.


Mas, logicamente, não é tudo. Outras passagens podem jogar um pouco mais de luz. Vamos por tópicos:

A Loja de Londres

O Mestre lembra a Hume que, em Londres, houve uma tentativa de se instalar uma Escola de Magia. Dela fez parte Eliphas Levi, entre outros nomes famosos. O Mahatma confessa que visitou essa escola “meia dúzia de vezes” e percebeu que seria um fracasso. E qual seria a causa do fracasso?  “a pestilenta atmosfera de Londres”.

E completou: “ E essa é também a razão por que a S.T. não dá praticamente um só passo adiante. Seus membros pertencem à Fraternidade Universal, mas só de nome, e gravitam no melhor dos casos, para o quietismo, uma paralisia completa da alma. São intensamente egoístas em suas aspirações e colherão apenas a recompensa de seu egoísmo.”

Atenção aqui para o fato de que o Mahatma citou Fraternidade Universal como um sinônimo de ST. Mas uma ST cujos membros não se movimentam estão em “uma paralisia completa da alma”, devido ao egoísmo.

O que dizer de nosso tempo? Estamos também com nossas almas paralisadas? Gravitamos para o quietismo? Somos egoístas em nossas aspirações?


Podemos, então, acrescentar à lista anterior:

(v)       A superação do egoísmo em nossas aspirações espirituais.


Conceito de Moralidade ou Os fins e os Meios

O Mestre ensina: “Como o homem nasce com livre-arbítrio e dotado de razão da qual brotam todas as suas noções de bem e mal,  ele não representa per se nenhum ideal moral definido. O conceito de moralidade em geral se relaciona em primeiro lugar com a INTENÇÃO ou MOTIVO, e, só depois, com os meios e os modos de ação."

Ora, se há egoísmo nas aspirações espirituais dos integrantes da Loja de Londres, poderíamos dizer, usando outra construção frasal, que os membros tinham a intenção egoísta em suas aspirações espirituais. E essa é uma herança trazida da educação religiosa. Como nos educam? O importante não é cada um “se salvar”?

Teríamos nós, membros da ST, que mudar a estação e alterar a intenção para “salvar os outros”? A resposta pode ser sim, mas essa mudança de estação passa pela moralidade como princípio universal e incondicional e, por  que não dizer, do Amor também baseado em tal princípio, de tal forma que a humanidade se sinta aquecida como os raios do sol o fazem.

Mas ainda há um complemento: os meios e os modos de ação.

O Mestre cita dois tipos de ação:

a)    O homem que usa maus meios para bons propósitos;

b)    O homem que usa bons meios para maus propósitos.

Em outra Carta (posterior), o Mahatma dirá que a moralidade está ligada ao princípio de que “os fins não justificam os meios”. O segundo caso é óbvio, de tão imoral. Mas o primeiro, nem sempre foi compreendido. Se os fins são bons, culturalmente entendemos que serão lícitos os meios, mesmo que nem sempre éticos. De  tal forma há uma crença generalizada nisso que nossa sociedade produziu Robin Hood, o herói que roubava dos ricos para dar aos pobres.

Nesse ponto podemos acrescentar à lista:

(vi)          cuidar de nossas intenções, de nossas motivações, especialmente como  membros da ST;

(vii)     Compreender, como parte da moralidade,  que os fins não justificam os meios.

Consciência

Hume aborda a questão da consciência. E o Mestre questiona que “o HOMEM tem sempre um guia seguro em suas percepções morais íntimas, ou  - consciência? Grande erro!”

“....a consciência pode, talvez, nos indicar o que não devemos fazer, mas nunca nos guiará para o que devemos realizar, nem dará um objetivo definido à nossa atividade.”

O contexto desse tema está no fato que Hume argumenta que nunca seria mesmerizado. Que sua consciência o faria perceber o fato. O Mahatma discorda e afirma que a consciência nunca o faria perceber se o mesmerizador é um adepto ou um hábil impostor, “uma vez que ele tenha cruzado o limiar e obtido o controle da aura que circunda a sua personalidade.”

E, a partir de um comentário irônico, mas que poderia ter sido entendido por Hume como um alerta, sobre o “trabalho inocente de colecionar pássaros”, afirma que a “imaginação, assim como a vontade, cria”. 

Assim, cremos que é possível incluir na lista mais um item:

(viii)    Fortalecer a vontade e usá-la, com imaginação, a fim de criar......


......o que?

Poderíamos completar na frase da seguinte forma, com base na análise dessa Carta, sem prejuízo que outros o façam diferentemente:

.....a fim de criar LOJAS QUE EFETIVAMENTE ABRIGUEM MEMBROS COM A INTENÇÃO ESPIRITUAL DE AJUDAR PESSOAS A SE ASSOCIAREM, ESTIMULANDO O ALTRUÍSMO, O DEVER, A MORALIDADE, A VONTADE, PARA QUE A FORÇA E O MAGNETISMO DAÍ CONSTRUÍDOS POSSAM SER CENTRADOS EM TORNO DE UMA IDEIA DOMINANTE (uma delas o de acelerar o ressurgimento da antiga civilização!) E, ASSIM, GEREM HOMENS E MULHERES, VOLUNTÁRIOS QUE SUBSTITUAM  OS   SENTINELAS CANSADOS DO GUARDIÃO DA LUZ.



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